download pdfFabio Salaorni,

Consultor Sênior

O cenário atual e os conceitos disruptivos de hoje desafiam as famílias empresárias a manter suas empresas saudáveis e de uma forma que sustente sua riqueza. Os acionistas devem entender como esses conceitos agem em todo o sistema familiar (empresa, investimentos, desenvolvimento de talentos e unidade familiar). Historicamente, as empresas familiares gerenciam bem os ciclos econômicos pois cresceram valendo-se da excelência operacional e estando à frente da concorrência. Entretanto, nem sempre estão preparadas para gerenciar os ciclos de vida de cada negócio, em que a competição não é com pares de mercado, mas com o mercado em si.

As famílias empresárias tipicamente concentram esforços em negócios operacionais e se tornam excelentes na gestão dos mesmos – mas essa característica pode trazer algumas desvantagens importantes: a demora em abandonar suas investidas no momento de declínio, devido em grande parte ao apego emocional e a falta de uma busca sistemática de oportunidades em novos negócios. Para tomar decisões acertadas em relação ao ciclo de vida dos negócios, é necessária uma visão de longo prazo dos setores nos quais estão inseridos e de outros setores que possam se tornar relevantes para ingressar. Tal visão não é trivial, ainda mais quando não há uma organização das discussões em fóruns específicos ou quando se está demasiadamente imerso nas questões operacionais da empresa. É necessário praticá-la.

Essa é uma das razões da existência dos sistemas de governança, que promovem a discussão entre membros da família e equipes de análise, consultores ou conselheiros que complementam a visão interna e externa das empresas. De forma geral, existem três grandes fóruns no sistema de governança familiar: o Conselho de Família, com o objetivo de aportar a visão de sustentação da família ao longo das gerações; o Conselho de Administração, que concentra as definições táticas dos negócios; e o Conselho de Sócios, que promove uma discussão dos investimentos e do portfólio – justamente o que mais contribui com a visão de longo prazo dos investimentos.

Sendo assim, quando temos um cenário externo que altera toda a dinâmica do mercado, como o que estamos passando, é importante não apenas readequar estratégias, mas também revisitar a alocação do patrimônio familiar. Essas são decisões que cabem aos sócios e não podem ser terceirizadas.

Além de liderar tais discussões e decisões, o Conselho de Sócios tem como responsabilidades: revisar a estrutura de capital das empresas do grupo, discutir a entrada de novos investidores ou abertura de capital, definir as principais regras do acordo de acionistas e revisitá-lo de tempos em tempos, estudar a compra e/ou venda de negócios ou de empresas, definir o nível de risco e de alavancagem, avaliar e atuar na composição do Conselho de Administração, entre outras.

O Conselho de Sócios se posiciona logo acima do Conselho de Administração, o que quer dizer que todas essas responsabilidades acabam refletindo nos níveis de governança logo abaixo, o Conselho de Administração. Como forma de organizar tais demandas, é importante que esse Conselho de Sócios envie ao Conselho de Administração uma diretriz ampla de todas as decisões tomadas. Dessa forma facilita o trabalho dos conselheiros e executivos, pois fica clara a estratégia e objetivos das empresas investidas.

Dentro do Conselho de Sócios, identificamos perfis que se complementam e são necessários para que sua efetividade seja potencializada. O perfil “operador”, que conhece profundamente o negócio e foca no curto e médio prazo, e o perfil de “acionista”, que segue fundamentos financeiros e tem uma visão de longo prazo, são comumente encontrados. É importante que haja apreciação e respeito mútuo desses perfis, além de espaço contribuições de ambos, afinal, o equilíbrio entre eles pode garantir uma visão ampla potencializando as melhores soluções no curto ou no longo prazo.

É comum vermos tais conflitos nas tentativas de diversificação de portfólio, que exigem não apenas tempo, apoio externo e discussões profundas de onde diversificar –  seja na empresa, na holding ou em nível individual –, mas também habilidades para superar obstáculos internos de sócios que podem encarar as sugestões de diversificação como provas de deslealdade e desalinhamento com a história e legado da família.

Portanto, o Conselho de Sócios é um órgão essencial no sistema de governança, que deve estar sustentado em  diálogo, escuta ativa, alinhamento de valores, missão e visão e respaldado em informações de qualidade para apoiar a tomada de decisões. Mais do que nunca, o sucesso e sobrevivência das empresas familiares depende de boas decisões no nível de propriedade.